Afundada em uma crise financeira que só se agravou desde o início da década de 80, a maternidade demitiu cerca de cem funcionários no final do mês passado. Desde o mês passado, um pequeno cartaz na entrada principal do prédio de 14 andares anuncia o fechamento e aconselha os usuários a procurar outros hospitais da região.
Hoje, pouco mais de dez funcionários ainda continuam trabalhando para evitar o abandono do prédio. Eles não têm nenhuma garantia de que vão receber o pagamento. Os funcionários que foram demitidos não receberam nada.
Sem pagamentos, Maria José e Mara Lúcia aguardam alguma definição
De acordo com o médico Nicolau Selvaggio, que faz parte do conselho fiscal e da comissão consultiva da maternidade, a dívida com os trabalhadores atinge os R$ 31 milhões. Além da rescisão contratual, também não foram pagos 18 meses de salários atrasados. Além disso, há dívidas tributárias e com fornecedores.
"O problema começou de 25 anos para cá e foi acumulando com a globalização", afirma Selvaggio. Ele admite que houve uma "má administração" no hospital que agravou o quadro, mas descarta a hipótese de irregularidades. Em 2001, o Sindicato dos Empregados em Estabelecimentos de Serviços de Saúde de São Paulo entrou, no Ministério Público, com um pedido de investigação sobre a administração da entidade.
Em 1997, a cooperativa alugou andares do prédio para a Unimed. Segundo Selvaggio, não houve a quitação de todos os pagamentos e o problema ficou ainda mais intenso. Nessa época, havia aproximadamente 400 funcionários.
Os leitos do hospital não têm garantia de voltar a receber pacientes
Solução
Na próxima quarta-feira, uma assembléia com a provedoria e a diretoria do hospital vai tentar encontrar uma solução. "A Maternidade de São Paulo é uma marca que não vai desaparecer. Ou a gente fica aqui ou vende e compra um prédio menor. O que não pode é morrer o nome", diz Selvaggio.
Encontrar uma solução, entretanto, não vai ser fácil. Embora o prédio esteja avaliado em R$ 44 milhões, a comissão consultiva sabe que vai ser praticamente impossível, na atual situação, encontrar em curto prazo um comprador disposto a pagar esse valor. A hipótese mais viável seria fechar uma parceria com um grupo de investidores. O hospital continua pronto para funcionar - com todos os equipamentos - dependendo de uma saída financeira.
O sindicato dos funcionários afirmou que conversou com a comissão consultiva e que teve a informação de que uma nova provedoria já está fechada para assumir inclusive as dívidas trabalhistas. Essa informação não coincide com as declarações de Selvaggio dadas à reportagem do US.
Decepção
A auxiliar de enfermagem Maria José Rodrigues Torres, 39, trabalhava há 20 anos no hospital quando foi demitida no mês passado. Não recebeu nenhum centavo. Está com um ano e meio de salários atrasados. "A gente espera que quem assumir (a provedoria) realmente lembre que a gente trabalhou aqui e tem dinheiro para receber", diz.
Apesar de estar demitida, ela vai com freqüência ao hospital, assim como várias outras colegas. Os funcionários acompanham de perto o desfecho do caso. Eles ainda têm a esperança de serem contratados novamente.
Embora já não esteja funcionando há semanas, a notícia ainda pega de surpresa muita gente que vai até o prédio. A enfermeira Vanessa M. Oliveira foi até lá na manhã desta segunda-feira para deixar um currículo. "Não sabia disso, me pegou de surpresa."
O taxista Vagner Barbosa da Silva também ficou surpreso, mas ainda mais decepcionado. Ele nasceu no local, em 1975. "Caramba, não acredito. Eu nasci lá, meu Deus. Para mim é uma surpresa."
História
Inaugurada em 1894, a Maternidade de São Paulo era a mais antiga da cidade de São Paulo. Até 1914, nada era cobrado pelo serviço e o atendimento era exclusivo para os pobres. Depois desse ano, começou o atendimento particular. Em 1970, a maternidade atingiu seu auge.
Foi em 1974, que o hospital mudou para a rua Frei Caneca, em Cerqueira César. A média diária de partos era acima dos 70. Existiam 1,2 mil funcionários e 400 leitos. O berçário tinha capacidade para 200 recém-nascidos.
Com a crise da maternidade, a média de partos caiu para menos de dez diários nos últimos anos.
|