A Comissão de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado, Violência e Narcotráfico vai retomar nesta quarta-feira, às 9 horas, no plenário 2, a discussão e votação do Estatuto do Desarmamento (PL 1555/03).
O presidente da Comissão, deputado Moroni Torgan (PFL-CE), garantiu que a votação será concluída hoje. A afirmação foi feita ao presidente da Câmara, João Paulo Cunha, que disse preferir que a proposta siga sua tramitação normal - que seja aprovada pela Comissão de Segurança Pública e depois pela Comissão de Constituição e Justiça e de Redação, em vez de ser votado diretamente pelo Plenário, como sugerido. Para João Paulo, é necessário que as comissões retirem "rebarbas jurídicas" do texto que, se chegarem ao Plenário, provocarão longos debates e retardarão a votação.
A discussão do relatório da deputada Laura Carneiro (PFL-RJ) à proposta, iniciada ontem (16), na Comissão de Segurança, foi interrompida à tarde devido ao início da Ordem do Dia do Plenário.
Como o prazo para a votação da matéria, que tramita em regime de prioridade, encerra-se na quarta, o presidente João Paulo poderia determinar que ele fosse votado pelo Plenário, antes de sua apreciação pelas comissões técnicas.
A relatora fez várias alterações no projeto, aprovado pelo Senado em julho deste ano. O projeto original restringia o porte de armas a policiais, militares e agentes de segurança. A relatora flexibilizou essa proibição, abrindo, entre outras, as seguintes exceções: oficiais de Justiça (quando em serviço), agentes de segurança judiciária, agentes da guarda judiciária nos tribunais de Justiça, guardas da Presidência da República, agentes de segurança dos ministérios, guardas portuários e agentes do Ibama (quando em serviço). O porte de armas para essas categorias estará sujeito a regulamentos próprios.
Laura Carneiro incluiu ainda os caminhoneiros entre os que podem ter porte de armas. Pelo texto, caminhoneiro é o motorista de veículos com carga superior a 10 toneladas. Ela explica que, sem essa definição, outros profissionais poderiam ser enquadrados como transportadores de cargas.
Também foi reduzida a idade mínima para a compra de arma de fogo. Na proposta aprovada pelo Senado, a idade era de 25 anos; no relatório, foi fixada em 21 anos.
A relatora também ampliou a destinação dos valores arrecadados com as taxas de porte e registro de armas. O projeto original reservava esses recursos apenas para a Polícia Federal. De acordo com o substitutivo, esse dinheiro irá para o Fundo Nacional de Segurança Pública, o que permitirá sua distribuição entre as polícias federal e estaduais.
O valor do registro do porte de armas foi reduzido de R$ 1 mil para R$ 650.
O substitutivo também altera o dispositivo que trata da liberdade provisória aos infratores da lei do porte de armas. O projeto do Senado considerava insuscetíveis de liberdade provisória, com ou sem fiança, os crimes previstos na lei, entre os quais a posse e o porte ilegais de armas. Laura Carneiro retirou a expressão "com ou sem fiança" porque, segundo ela, o fato de serem considerados insuscetíveis de liberdade provisória já os torna inafiançáveis.
A alteração é questionada por organizações não-governamentais que defendem o desarmamento. Essas entidades acreditam que a retirada da expressão deixará à mercê do juiz a fixação ou não de fiança.
O substitutivo prevê, ainda, que o interessado em adquirir arma de fogo atenda a vários requisitos, entre eles o de não estar respondendo a processo criminal por infração penal dolosa (com intenção). O texto aprovado no Senado estendia a restrição a qualquer processo penal, incluindo os crimes culposos (cometidos sem intenção).
Laura Carneiro manteve em seu parecer o referendo previsto para outubro de 2005, quando a população vai ser chamada a decidir se quer a proibição total do comércio de armas.
O deputado Antônio Carlos Biscaia (PT-RJ) adiantou que o seu partido apresentará destaques para votação em separado ao substitutivo da deputada. Os destaques, segundo ele, foram sugeridos pelo ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, com o objetivo de restabelecer o projeto que veio do Senado.
Biscaia antecipou que o PT pedirá a retirada dos dispositivos que ampliam as categorias autorizadas a ter o porte de armas; e votará pelo restabelecimento da idade mínima de 25 anos para a compra de armas de fogo. Ele explica que os índices de homicídio indicam que 100 crimes praticados em um universo de 100 mil habitantes atingem pessoas de 15 a 24 anos, como autores ou vítimas.
O PT quer retirar ainda a expressão "crime doloso", mantendo a redação original do Senado, que estendia a restrição a qualquer processo penal, incluindo os crimes culposos.
Laura Carneiro já acatou sugestão do presidente da Comissão de Segurança, Moroni Torgan (PFL-CE), para que o texto diferencie as penas para o porte ilegal e o tráfico de armas.
A legislação atual prevê 2 anos de prisão para ambos os crimes. Na sugestão, Moroni Torgan propôs pena de 2 a 4 anos para o porte ilegal de armas; de 4 a 8 anos para o tráfico de armas permitidas; e de 6 a 10 anos para o tráfico de armas de uso proibido ou restrito às Forças Armadas
A discussão do substitutivo, realizada na manhã de ontem (16), na Comissão de Segurança Pública, foi acompanhada de perto por entidades em defesa do desarmamento. Os movimentos contra a violência pressionaram os deputados a votar contra o relatório.
Mães de vítimas de crimes com armas de fogo fizeram apelos aos parlamentares para que o texto original seja restabelecido. Uma delas foi Leda Janot, que perdeu o filho há 3 anos. Maurício foi assassinado aos 28 anos de idade por um ex-funcionário da empresa dele, demitido porque foi pego roubando. O assassino disse que trocou um vídeo-cassete pela arma do crime, numa feira ao ar livre do Distrito Federal.
Os defensores do texto da parlamentar carioca também protestaram. O deputado Alberto Fraga (PMDB-DF) afirmou que não é representante do "lobby das armas", como a mídia vem divulgando. Ele disse que apenas defende que as pessoas possam ter armas com as restrições já previstas na lei atual. Fraga reconhece que a legislação precisa de aperfeiçoamento, mas não de revogação. Segundo ele, o que está surgindo na Casa é uma "proposta de marketing".
A relatora disse que tem uma posição pessoal favorável ao desarmamento, mas acredita que a produção de uma lei deve ser resultado de consenso entre as várias opiniões existentes. "Estou aberta à busca desse consenso, mas não me peçam para tirar pontos que são vitais ao projeto", disse Laura Carneiro.
|