Inspeção da ONU gera crise entre poderes e presidente do TST sugere até rebelião

 

Nacional - 10/10/2003 - 09:35:44

 

Inspeção da ONU gera crise entre poderes e presidente do TST sugere até rebelião

 

Da Redação com Abr

Foto(s): Divulgação / Arquivo

 

 A sugestão de uma inspeção internacional das Nações Unidas no Judiciário brasileiro, feita dia 08 pela enviada especial da ONU para a questão das execuções sumárias, Asma Jahangir, detonou, ao menos no plano verbal por enquanto, uma crise entre os poderes Judiciário e Executivo. O bate-boca envolveu presidentes de tribunais e o ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu, e tornou-se também espaço para um desabafo dos ministros do Judiciário, que reclamam de “antipatia” do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST), Francisco Fausto, disse hoje que os representantes do poder Judiciário se oporão a uma eventual inspeção, mesmo que ela seja apoiada pelo próprio presidente Lula. “Farei, se for o caso, uma recomendação a todos os tribunais do Trabalho a fim de que não permitam uma intromissão de agentes da ONU”. Fausto qualificou de “infeliz” o apoio à idéia de Asma por parte do presidente Lula, a quem acusou de ter má vontade com o Judiciário. “A relação que ele tem com o Judiciário não é a melhor”, afirmou. Para o ministro, Lula tem uma “queixa” com o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Maurício Correa. “Mas isso deveria ficar no plano das relações pessoais”, completou. Corrêa, que está hoje em Porto Alegre, por sua vez, reclamou de o presidente Lula não o cumprimentar nas ocasiões em que se encontram, como no desfile de Sete de Setembro. “Está havendo uma confusão entre uma certa antipatia que se possa ter com uma pessoa e a sua obrigação institucional”. Ele também considerou “inadequada, inoportuna e infeliz” a sugestão da enviada especial da ONU. Fausto chegou a citar expressão de Lula, que, em abril, num discurso em Vitória, falou da necessidade de abrir a “caixa-preta do Judiciário”. “Parece que querem mostrar que a Justiça tem mazelas ou caixas-pretas a serem abertas, o que não é verdade, pois o Judiciário brasileiro é absolutamente transparente”, disse o presidente do TST. A discussão transcendeu a questão da relação entre os Poderes da República. Fausto disse que uma eventual inspeção “afeta o próprio Estado brasileiro” e “interfere na soberania nacional”. O ministro José Dirceu minimizou as divergências e disse hoje em Brasília que “o que está havendo é uma tempestade em copo d’água”. Ele defendeu a necessidade de “reformar” as instituições brasileiras e, para tanto, “trabalhar em conjunto com as instituições internacionais”. Para o ministro, uma eventual inspeção não fere a soberania brasileira. “O Brasil é signatário de um Tribunal Penal Internacional, portanto, o país, no seu relacionamento internacional, preservada a sua soberania, preservada a sua Constituição, e também a autonomia e a independência do Judiciário, tem que dialogar, ouvir, prestar contas às entidades internacionais, isso sem ferir a soberania do país e sem ferir a independência dos poderes”. Disse também que “se a cada discussão (como essa) houver esse tipo de reação, não vamos ter democracia no país”. E completou. “Devemos tapar o sol com uma peneira e dizer que não existe tortura, violação dos direitos humanos, assassinatos no Brasil?”. Apoios aos tribunais Entidades ligadas à Justiça manifestaram apoio às declarações de Fausto, Corrêa e Nilson Naves, presidente do Supremo Tribunal de Justiça, que ontem também se disse contrário à sugestão de Asma. O Conselho da Justiça Federal, entidade que congrega a Justiça Federal brasileira, divulgou nota sobre o tema. O texto foi assinado pelo ministro Ari Pargendler, coordenador-geral da Justiça Federal. Associaçãos estaduais de magistrados também registraram apoio. O presidente em exercício da Ordem dos Advogados do Brasil, Roberto Antonio Busato, disse hoje que os “problemas crônicos” do Judiciário “são problemas nossos, dos brasileiros, e nos resta resolvê-los”. Para ele, a proposta de Asma “não tem lógica e fere a soberania nacional”. À justificativa da relatora, de que a Justiça brasileira é ineficiente na contenção da violência no País, Busato responde que a origem desse problema está na “ganância do capital especulativo”. Para ele, os organismos financeiros internacionais estão preocupados com o Judiciário brasileiro, porque suas decisões “afetam as reservas destinadas aos pagamentos de juros escorchantes de nossa dívida”. Ele sugere, em lugar de uma missão voltada ao Judiciário, uma inspeção dessa dívida. A recomendação que Asma deve encaminhar à ONU foi declarada em entrevista coletiva ontem em Brasília, após audiência de quase duas horas com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, encerrando a missão da enviada especial no País, que se iniciou em 16 de setembro. Em Santo Antônio de Jesus (BA), foi executado ontem o mecânico Gerson Jesus Bispo, 26, testemunha da ação de grupos de extermínio que havia deposto à relatora da ONU em 20 de setembro. Duas semanas antes, o lavrador Flávio Manuel da Silva, 33, outra testemunha que havia falado com Asma, foi assassinado em Pedras do Fogo (PB), na divisa entre Pernambuco e Paraíba.

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