O trabalho escravo, um câncer que não é exclusividade da sociedade brasileira e que existe inclusive nos Estados Unidos, está prestes a sofrer um golpe violento nos próximos dias. Já está praticamente concluída pela Secretaria de Inspeção do Trabalho, do Ministério do Trabalho, uma “lista suja” com a relação de empresas que já utilizaram financiamentos públicos para a contratação de trabalhadores em regime análogo ao da escravidão. Assim que estiver pronta, a lista será remetida ao ministro da Secretaria Especial de Direitos Humanos, Nilmário Miranda, que vai propor ao governo que financiamentos e incentivos fiscais concedidos a estas empresas sejam cancelados e que elas não tenham direito a novos empréstimos públicos. Por outro lado, o Ministério Público Federal analisa, desde março deste ano, 576 notícias de trabalho escravo que estavam paradas no Ministério do Trabalho desde 1995.
A procuradora Raquel Dodge, que conduz as investigações, informou que só uma destas empresas obteve, ao longo de cinco anos, financiamentos da ordem de US$ 6 milhões da Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia (Sudam), R$ 2 milhões do Banco da Amazônia (Basa), além de pequenos empréstimos do Banco do Brasil. O dinheiro seria para tocar um empreendimento no sul do Pará e, segundo Raquel Dodge, uma parte foi utilizada para contratar mão de obra escrava.
As 576 notificações foram repassadas ao Ministério Público, pelo Ministério do Trabalho, em março deste ano. “Os dados colhidos até o momento pelo Ministério Público mostram que não houve desenvolvimento regional nestes 40 anos de financiamentos da Sudam, mas, sim, concentração de renda nas mãos de grandes empresários. Todos com empresas sediadas em São Paulo, Rio de Janeiro e outros estados”, afirmou a procuradora.
Parte das investigações destas 576 denúncias já foram concluídas, informou Raquel Dodge. Muitas destas, acrescentou, evidenciam que a Sudam emprestou dinheiro para empresas que empregaram mão de obra escrava. O mesmo aconteceu com instituições financeiras públicas como o Basa, o Banco do Brasil e o Banco do Nordeste (BNB), informou. “O emprego destes recursos acabou financiando indiretamente o trabalho escravo”, ressaltou a procuradora. Ela isentou o governo federal de culpa neste processo. A seu ver, os tomadores destes empréstimos foram “inescrupulosos, tentando baratear o custo de seus empreendimentos utilizando mão de obra escrava”.
Hoje, a Secretaria Especial de Direitos Humanos em parceria com a Organização Internacional do Trabalho (OIT) apresentou a Campanha Nacional para Erradicação do Trabalho Escravo, que estará na mídia nos próximos dias. A cerimônia aconteceu no Congresso Nacional e contou com a presença dos ministros Jaques Wagner (Trabalho) e Nilmário Miranda (Direitos Humanos), do presidente do Tribunal Superior do Trabalho, Francisco Fausto, além de representantes da OIT, Ministério Público e parlamentares ligados a questão dos direitos humanos.
O diretor da Organização Internacional do Trabalho no Brasil, Armand Pereira, afirmou que a causa primordial do trabalho escravo é a impunidade e a clandestinidade. Segundo ele, as taxas de desemprego e de desenvolvimento de um país são insuficientes para justificar a existência de trabalho escravo. Armand Pereira destacou que até nos Estados Unidos há registros de emprego de mão de obra escrava. Também não é uma exclusividade de estados do norte, nordeste e centro-oeste. Segundo o diretor da OIT, o trabalho escravo é registrado em estados como o Rio Grande do Sul, Santa Catarina e região metropolitana de São Paulo. “Se alguém criticar o Brasil por causa da utilização de mão de obra análoga ao da escravidão, o país pode, hoje, dizer que tem um programa concreto, com medidas concretas de combate a este problema”, ressaltou.
O presidente do TST, Francisco Fausto, reconheceu que o governo Lula vem fechando o cerco aos fazendeiros e empresários que utilizam mão de obra escrava. Acrescentou que, eventualmente, as pessoas têm a idéia equivocada de que o problema está recrudescendo. O que acontece, de acordo com o presidente do TST, é que a fiscalização foi intensificada e os casos estão vindo à tona.
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