Guerra contra o Iraque mostra que EUA devem reduzir sua sede de petróleo

 

Economia - 21/02/2003 - 15:50:35

 

Guerra contra o Iraque mostra que EUA devem reduzir sua sede de petróleo

Energia para limitar dependência externa, país precisa conter o consumo; taxar mais o combustível é opção .

 

Da Redação com agências

Foto(s): Divulgação / Arquivo

 

Os EUA deveriam diversificar suas compras pelo mundo e utilizar melhor suas reservas estratégicas.

Os EUA deveriam diversificar suas compras pelo mundo e utilizar melhor suas reservas estratégicas.

As tropas americanas já estão às portas do Iraque, preparando-se para atacar Saddam Hussein. O nervosismo da guerra abala todo planeta, com um efeito inevitável: o aumento no preço do petróleo. O barril de petróleo subiu mais de 33% nos últimos três meses, chegando a US$ 35 nos EUA. Os modelos econômicos prevêem que se o preço continuar alto durante mais três meses, reduzirá o PIB americano em US$ 50 bilhões durante o trimestre. Se a guerra correr mal, se Saddam incendiar poços no Iraque e em outros países ou se algum desastre em outra parte reduzir a oferta, a economia mundial sofrerá um choque. Não há como escapar às conseqüências da sede de petróleo. É ele que impulsiona o vasto motor do comércio, transportando bens, levando os pais para o trabalho e os filhos para o treino de futebol. Enquanto os EUA importarem mais de 11 milhões de barris por dia - ou seja, 55% de seu consumo total - qualquer incidente, desde uma greve na Venezuela até as crises no golfo Pérsico, atingirá duramente a economia americana. “Somos vulneráveis a qualquer evento, em qualquer lugar, que afete o fornecimento ou a demanda por petróleo”, diz Robert E. Ebel, diretor do programa de energia do Centro de Estudos Estratégicos & Internacionais (CSIS). Num discurso em fevereiro, o presidente George W. Bush resumiu: “É um risco para a nossa segurança depender de fontes de energia de países que não têm amizade pelos EUA, por aquilo que defendemos, aquilo que amamos.” Um único país, a Arábia Saudita, possui em seu subsolo as maiores reservas mundiais comprovadas - 265 bilhões de barris, ou 25% do total - e pode fazer disparar ou afundar os preços simplesmente abrindo ou fechando as torneiras. Por enquanto, os sauditas são amigos dos EUA e estão aumentando a produção para evitar uma alta excessiva dos preços. E se houver mudança na política saudita? “A economia mundial inteira se sustenta sobre essa aposta: quanto tempo mais durará a dinastia saudita?” diz Philip E. Clapp, do Fundo Nacional do Meio Ambiente. A boa nova é que pode-se apostar com mais segurança. Com base em entrevistas com dezenas de economistas, analistas de petróleo, ambientalistas e outros peritos em energia, a “Business Week” elaborou uma série de linhas mestras para uma política energética sensata e viável. São medidas baseadas nas tendências positivas do passado. Se implementadas, reduziriam a vulnerabilidade às guerras do Oriente Médio e outras crises. O plano ainda tem o benefício de atacar o problema do aquecimento global, tido como a maior ameaça econômica deste século. A política energética defendida pela “BusinessWeek” consiste de seis passos essenciais. Do lado do fornecimento, os EUA deveriam diversificar suas compras pelo mundo e utilizar melhor suas reservas estratégicas. Também é preciso aumentar a eficiência energética em toda a economia, incluindo melhorias expressivas no consumo de combustível dos veículos. Como conseguiremos isso? Promovendo novas tecnologias e fontes alternativas de energia, com verbas para pesquisa e incentivos fiscais, e aumentando os impostos sobre a energia para refletir melhor o verdadeiro custo da utilização de combustíveis fósseis. Os economistas advertem que é impossível projetar os efeitos exatos dessas medidas. Mas, pelos cálculos da “BusinessWeek”, a um custo de US$ 120 bilhões a US$ 200 bilhões ao longo de dez anos - ou seja, menos do que custa para a economia um aumento significativo e prolongado do preço do petróleo - deve ser possível aumentar a eficiência energética da economia em até 50%, e reduzir o consumo de petróleo nos EUA em mais de 3 milhões de barris/dia. Uma idéia falsa é que tornar os EUA auto-suficiente, ou dispensar o petróleo do Oriente Médio, nos protegeria de cortes no fornecimento e aumentos de preço. Na verdade, o petróleo se tornou uma mercadoria fungível mundial. Mesmo que cortássemos o cordão umbilical com o golfo Pérsico comprando mais do Canadá, México ou Rússia, ou aumentando a produção doméstica, outros países passariam a comprar o petróleo que sobraria no Oriente Médio. O preço e o potencial de aumento no preço continuariam iguais. Enquanto não houver verdadeiros monopólios de petróleo, não importa onde o conseguimos. O que importa é quanto consumimos. Contudo, uma redução no uso do petróleo precisa ser feita de maneira judiciosa. Uma queda drástica ou abrupta na demanda poderia ser até contraproducente. Por que? Porque mesmo uma mudança muito pequena na capacidade ou na demanda “pode acarretar grandes alterações de preço”, diz Rajeev Dhawan, diretor do Centro de Previsões Econômicas do Robinson College of Business, da Universidade Estadual da Geórgia. Por exemplo, a retração econômica da Ásia em meados dos anos 90 reduziu a demanda em apenas 1,5 milhão de barris diários, mas derrubou os preços de petróleo até perto de US$ 10. Assim, se os EUA conseguissem hoje frear abruptamente a demanda por petróleo, os preços entrariam em queda livre. Os produtores de alto custo, como a Rússia e EUA, teriam de vender seu petróleo com grande prejuízo ou esperar uma mudança na situação. O efeito seria concentrar o poder nas mãos dos países do Oriente Médio, que produzem a menor custo e detêm dois terços das reservas conhecidas. É por isso que políticas energéticas erradas, como tentar anular as forças do mercado expandindo a oferta às pressas, ou exigir aumento na eficiência, poderiam ser prejudiciais. A verdade é que a política realista pós-anos 70, que deixou os mercados agirem livremente, não foi de todo ruim. Houve dolorosos choques no mercado petrolífero, que trouxeram recessões - mas causaram um notável aumento na eficiência energética da economia dos EUA. Dos anos 30 até os anos 70, o país gerava cerca de US$ 750 de produção por barril de petróleo. Esse número dobrou para US$ 1.500 no final dos anos 80, mas nos anos 90 os progressos cessaram. O equilíbrio crucial consiste em reduzir o uso do petróleo sem prejudicar a economia, e sem permitir que os preços caiam tanto que empresas e indivíduos abandonem os esforços para economizar energia. Conseguir esse equilíbrio pode trazer benefícios. Eis os detalhes: 1. Diversificar o fornecimento de petróleo. A resposta para a questão da oferta é uma combinação delicada de tecnologia, forças de mercado e diplomacia. Por exemplo, novas tecnologias para perfurar em águas profundas, de mais de 3 mil metros, estão abrindo fontes inexploradas na bacia Atlântica, Brasil, Caribe, Canadá e toda a costa ocidental da África. Esse fato ajuda a refazer o equilíbrio entre os produtores de petróleo. Em 1973, o Oriente Médio produziu 38% do petróleo mundial; agora caiu para menos de 30%. Ainda há muito petróleo a ser explorado. As reservas comprovadas chegam a 1 trilhão de barris, mas as estimativas quanto ao potencial não explorado não param de aumentar - de 2 trilhões de barris, cálculo do início dos anos 80, para a estimativa atual de mais de 3 trilhões. A área do mar Cáspio promete reservas de 20 a 35 bilhões de barris, mas poderiam chegar a mais de 200 bilhões. Se a política energética fosse apenas uma questão de economia, poderíamos argumentar que o mundo deveria aproveitar as amplas reservas e os preços relativamente baixos e continuar consumindo com rapidez. Mas há custos adicionais no petróleo, hoje não incluídos no preço. Temos outras metas importantes, tais como proteger o meio ambiente e reduzir o poder político do Oriente Médio. 2. Usar as reservas estratégicas. Os EUA possuem 599,3 milhões de barris armazenados em cavernas salinas subterrâneas na costa do Texas e da Louisiana. É o suficiente para substituir a produção petrolífera do Iraque durante pelo menos seis meses. Mas essas reservas não estão sendo usadas corretamente, segundo especialistas. Na Guerra do Golfo, “os preços de petróleo voltaram ao nível normal quando os EUA liberaram a reserva estratégica”, diz W. David Montgomery, economista especializado em energia da Charles River Associates. Com os preços de petróleo já subindo, “deveríamos utilizar a reserva imediatamente”, diz ele. Outros peritos argumentam que a reserva deve ser usada como instrumento regular de proteção contra as altas do petróleo, e não economizada só para emergências extremas. Há reservas semelhantes na Europa, Japão e Coréia do Sul - num total de 4 bilhões de barris, incluindo os EUA - que também deveriam ser usadas assim. 3. Aumentar a eficiência industrial. Após décadas de preocupação com os preços da energia e grandes melhoras na eficiência energética geral da economia, poderíamos pensar que as empresas americanas não teriam como conseguir novos ganhos. “Pela minha experiência, os fatos atestam o contrário”, diz Judith Bayer, diretora de assuntos governamentais para o meio ambiente da United Technologies. A UT fez uma economia de US$ 100 mil em apenas uma fábrica, desligando os monitores dos computadores à noite. No ano passado a Food Lion, empresa de Salisbury, Carolina do Norte, reduziu seu consumo de energia em 5% usando sensores para desligar as luzes nos banheiros e nas áreas de carga, e instalando portas com melhor isolamento nos freezers. Mesmo empresas que já têm um bom histórico de eficiência estão se esforçando mais. Toda a antiquada rede elétrica dos EUA deveria ser modernizada, transformada numa rede “inteligente”, flexível, com respostas rápidas e controles digitais. Isso reduziria em 30% a quantidade de energia necessária para produzir US$ 1 de PIB, e economizaria ao país US$ 100 bilhões por ano, avalia Kurt E. Yeager, CEO do Electric Power Research Institute (EPRI). A modernização eliminaria a necessidade de construir dezenas de usinas elétricas, reduziria as emissões de gás carbônico e as interrupções de energia, que custam ao país US$ 120 bilhões por ano. 4. Aumentar a quilometragem por litro dos carros. Para obter uma verdadeira redução no consumo de petróleo, os EUA precisam encarar o problema do transporte. Os números são muito maiores que nos outros setores, respondendo por dois terços dos 20 milhões de barris de petróleo consumidos diariamente. Os culpados são os veículos esportivos e as picapes, com sua alta taxa de consumo. Se aumentarmos a eficiência dos atuais 10,20 km/l para 17 km/l, a economia de combustível será de 2 milhões de barris/dia em dez anos. As fábricas de automóveis afirmam que essa meta é muito elevada, mas a tecnologia necessária já existe. No início de janeiro a General Motors lançou carros híbridos, que combinam motores elétricos e a gasolina, gerando uma economia de consumo de 15% a 50%. Qual seria o custo de se aumentar a eficiência para 17 km/l ou mais para toda a frota americana? As estimativas variam muito. Assumindo uma combinação de várias tecnologias, calculamos que o custo poderia ser de US$ 1 mil a US$ 2 mil por carro, isto é, US$ 80 bilhões a US$ 160 bilhões ao longo de dez anos. Ou seja, custaria menos do que a economia de combustível durante a vida útil de um veículo novo. Os fabricantes de automóveis já possuem essa tecnologia. O necessário são novas políticas, desde preços mais altos de gasolina até normas severas de economia de combustível, que incentivem fabricantes e consumidores a produzir e comprar esses veículos. A última palavra da tecnologia para a economia no consumo seria mudar para um combustível completamente diferente, tal como o hidrogênio. A Toyota, a Honda e a GM já estão testando carros que usam células desse combustível para impulsionar um motor elétrico. Esses veículos são silenciosos, não poluem e não emitem o dióxido de carbono associado ao aquecimento global. Mas são caros e ainda estão a dez ou vinte anos de distância do mercado comercial. 5. Promover a energia renovável. Embora hoje menos de 0,5% da energia nos EUA provenha das turbinas a vento, essa é a fonte mais barata de energia “verde”, não poluente, e a de mais rápido crescimento. A Associação Americana de Energia Eólica acredita que os EUA poderiam facilmente alcançar o norte da Europa, onde o vento já fornece até 20% da energia. Nos EUA isso seria o equivalente a 100 mil megawatts de capacidade - mais de 100 grandes usinas de combustível fóssil. As Grandes Planícies americanas poderiam se tornar um novo Oriente Médio, gerando vento em vez de petróleo. Sem reduções de impostos e outros incentivos, a energia eólica não poderá decolar. Mas o petróleo e outros combustíveis fósseis também contam com grandes subsídios, de modo que deveríamos eliminá-los, ou então oferecer incentivos razoáveis para alternativas como o vento, o hidrogênio e a energia solar. Mesmo que essas novas fontes custem mais do que as tradicionais, as inovações constantes, incentivadas pelos benefícios fiscais, reduzirão os preços. 6. Introduzir gradualmente impostos sobre combustíveis. A principal razão que fez diminuir os ganhos na eficiência de combustível nos EUA nos anos 90 é que o custo do petróleo, e da energia em geral, era muito baixo. “Somos incorrigíveis consumidores de energia porque ela é barata”, diz Dhawan, da Universidade da Geórgia. Embora pareça que o mercado está trabalhando para isso, não está. Há um consenso de que o preço do petróleo não reflete seu verdadeiro custo para a economia. “O que os americanos precisam saber é que o custo da gasolina é muito superior a US$ 1,50 por galão”, diz Gal Luft, do Instituto para a Análise da Segurança Global. Mas a mão invisível do mercado poderia realizar sua mágica se incluísse o custo dos fatores externos, como a poluição ou as guerras no Oriente Médio. Isso aumentaria o preço, estimulando medidas em favor da eficiência no consumo e do uso de fontes renováveis de energia. O difícil é atribuir um preço a esses fatores externos. Economistas calculam em 5 a 10 centavos de dólar por galão de gasolina. Outros crêem que o verdadeiro custo é o dobro ou o triplo do preço atual. Segundo o economista Darwin C. Hall, da Universidade da Califórnia, basta acrescentar US$ 100 bilhões ou mais - o custo de manter a presença militar e guerras no golfo Pérsico - e o petróleo deveria custar mais US$ 13 por barril. Imagine, porém, que num mundo ideal pudéssemos entrar em acordo quanto ao preço dos fatores externos - digamos US$ 10 por barril. É óbvio que não desejaríamos impor de repente um imposto de US$ 10 sobre o petróleo. Segundo as previsões, isso cortaria mais de US$ 50 bilhões do PIB, arrastando a economia para uma recessão. Porém aumentando esse imposto gradualmente, ao longo de dez anos, daríamos tempo à economia para adotar medidas de eficiência energética a custo mínimo. Também deveríamos considerar impostos adicionais sobre a gasolina, já que a alta de US$ 10 por barril significa apenas cerca de 25 centavos por galão de gasolina - não o suficiente para causar grandes mudanças no hábito de consumo. Há um acirrado debate para saber se a economia iria ganhar ou perder com essas mudanças tributárias, mas os economistas concordam que os efeitos negativos seriam relativamente pequenos. “É verdade que não existe ‘almoço grátis’, mas quase com certeza existe um almoço a um preço que vale a pena pagar”, diz Lawrence H. Goulder economista de Stanford. Se os impostos sobre a energia se revelarem politicamente impossíveis, há outra maneira de se conseguir preços realistas para os combustíveis fósseis: pela porta de trás, via política de mudanças climáticas. A Europa já está alterando os impostos sobre as emissões de gás carbônico para lutar contra aquecimento global, e as multinacionais experimentam esquemas de permuta de carbono, adiantando-se a quaisquer futuras restrições. Se os EUA lutarem contra as alterações climáticas, isso ajudaria o mundo inteiro a conseguir emissões mais baixas, e preços de petróleo moderadamente mais altos. A melhor abordagem é uma combinação de impostos sobre as emissões e um sistema de permuta, pelo qual as empresas podem negociar o direito de fazer emissões. No governo Bush isso também pode ser difícil de pôr em prática. O que nos sobra são as leis e os regulamentos. Uma boa idéia é dar créditos às fábricas de automóveis cujos veículos superam as metas de economia de combustível — créditos que elas poderiam vender às fábricas cuja frota não atingiu as metas de eficiência. Assim, as empresas “boas”, como a Honda, teriam motivação para continuar aperfeiçoando tecnologias. Os economistas discutirão o custo dessas medidas, mas os benefícios da maior eficiência energética e menor vulnerabilidade devem superar o custo de US$ 120 bilhões necessário para chegarmos lá. Embora doloroso, o choque do petróleo dos anos 70 levou os EUA a uma economia energética eficiente e menos vulnerável. A tarefa é encontrar o caminho para continuar essa jornada.

Os EUA deveriam diversificar suas compras pelo mundo e utilizar melhor suas reservas estratégicas.

Os EUA deveriam diversificar suas compras pelo mundo e utilizar melhor suas reservas estratégicas.

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