A população brasileira acaba de demonstrar que tem poder e sabedoria para decidir seu futuro. O Referendo do domingo passado, além de ratificar o direito da legítima defesa, sinalizou que a sociedade, quando chamada ao debate, responde de forma inteligente. Isso, sem dúvida, é uma demonstração de amadurecimento.
A consulta popular deve também servir de alerta para quem postula cargos nas próximas eleições. Aqueles que ainda acreditam na facilidade de manipular a opinião pública e que não utilizam seus mandatos em favor de quem os elegeu deverão ter sérios problemas daqui para a frente. Quem pensa que o eleitor não é consciente deverá rever seus conceitos.
A vitória do Não – a partir de uma ampla campanha de conscientização, com o envolvimento de toda a população – serviu para esclarecer de forma bastante objetiva o que se pretendia com essa consulta. O Não, que começou a campanha com menos de 30% de preferência nas primeiras pesquisas de opinião, venceu com ampla maioria.
Na prática, prevaleceu a vontade da população, que não aceitou ser enganada. De nada adiantou a tentativa dos defensores do Sim de utilizar pessoas ilustres, principalmente artistas, para ganhar a simpatia do eleitorado. Mais uma prova de que a velha estratégia de se esconder atrás de figuras públicas, de grande apelo popular, não se revela tão eficaz como em eleições passadas, quando as celebridades tinham um espaço maior.
A decisão do povo em rejeitar a proibição do comércio não significa que a população irá se armar. Longe disso. Revela a disposição das pessoas em poder decidir, de forma livre, se querem ou não ter uma arma em casa. O Estatuto do Desarmamento já impõe regras bastante rígidas para quem tem essa intenção. Só que a decisão, em vez de ser imposta, passa pela consciência de cada cidadão.
Vale agora, aos defensores do Sim ou do Não, darem um passo à frente e trabalharem – de forma concreta – pela diminuição dos índices de violência. A vitória do Não provou que a população quer isso. Porém, a diminuição da criminalidade só será possível com a instituição – nos diferentes níveis do poder – de boas políticas de segurança pública. Há muito tempo que União, Estado e Municípios demonstram ser incapazes no combate à violência.
Caso não haja posturas decisivas e sérias para a implantação de uma política nacional de segurança pública, que venha a reger as ações estaduais e municipais, de forma uniforme e bem direcionada, seguiremos destinando milhões na construção de presídios, que jamais serão suficientes para abrigar o grande contingente de criminosos. Em vez de atacar os efeitos, são necessárias ações em relação às causas, que começam muito antes da construção de cadeias e sustentação de presos.
Que a vitória do Não sirva também para uma grande virada em direção a resultados positivos para a sociedade. Cabe ao poder público fazer investimentos em áreas que permitam a inclusão social, de forma a diminuir efetivamente os índices de criminalidade. Agora, é o momento de todos dizermos Sim à implantação de uma verdadeira política de segurança pública. Com o Estado cumprindo seu papel, o cidadão comum não terá a necessidade de se armar para se defender.
Neste momento, quando parar de arrumar desculpas e atribuir a responsabilidade pela violência à população, que o governo possa sugerir um novo referendo para saber se o brasileiro aprova ou não sua política de segurança pública. Infelizmente, até isso ocorrer, muitas vidas se perderão.
(*) Romeu Tuma é delegado de Classe Especial da Polícia Civil, deputado estadual (PMDB), ex-presidente e atual integrante da Comissão de Segurança Pública, presidente da Comissão de Defesa dos Direitos do Consumidor e Corregedor da Assembléia Legislativa de São Paulo
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