Como Nova York, Londrina, no Paraná, tem suas Torres Gêmeas. E, a partir das 11h de 4 de outubro, terça-feira, o Twin Business Towers sofrerá um ataque. Virá na forma de um depoimento que a ex-assessora financeira da campanha petista de 2004 Soraya Garcia fará à CPI dos Correios. Atingirá o 17º andar da Torre 1, onde, segundo a Polícia Federal, funcionava a central do caixa 2 do PT local. Nas duas últimas semanas, a reportagem de ISTOÉ checou o que Soraya tem a dizer. O arsenal é pesado. Um dos alvos será o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo. Os petistas do Paraná tentam minimizar o depoimento de Soraya, mas a PF – que em julho já ouviu parte de suas denúncias – está convencida de que ela reinou sobre as “contas não contabilizadas” do PT de Londrina – que registra despesas de R$ 1,3 milhão, segundo a prestação de contas do partido à Justiça Eleitoral, e gastos de R$ 6,5 milhões pelo caixa 2, como delatou a ex-assessora ao Ministério Público.
“Durante a campanha, o dinheiro chegava em sacolas e sempre coincidia com a presença do então deputado Paulo Bernardo na cidade”, dispara Soraya, recontando o que via e ouvia na cúpula do partido. Como o seu chefe imediato, Augusto Ermétio Dias Júnior, não permitia recibos e apagava qualquer registro no computador, Soraya fez o depoimento em julho baseado na memória. As investigações posteriores, porém, atestam boa parte do que foi dito. Cumprindo ordem judicial, promotores e 40 agentes da PF amanheceram na quarta-feira 3 de agosto nos arquivos de 22 empresas da cidade apontadas pela ex-assessora. A varredura produziu 48 caixas de documentos. “Estes papéis comprovam o caixa 2, a contabilidade paralela na campanha do PT em 2004”, disse em entrevista coletiva, no final do dia, o delegado-chefe da PF em Londrina, Sandro Roberto Viana dos Santos.
No dia seguinte, quinta-feira, o Diário Oficial da União publicou portaria transferindo o delegado para Marília (SP). Enigmático, ele observou: “Cumpri o meu dever. Existe um contexto em cima disso.” O contexto é pesado. Às 8 h da quarta-feira, momentos antes da devassa nas 22 empresas, oculta sob um cobertor no banco traseiro de uma caminhonete, Soraya foi levada para a PF. Na sala de Sandro, ficou à espera dos documentos. Uma hora depois chegavam as caixas apreendidas. Lá pelas 13 h, enquanto vasculhava o material, Sandro encontrou uma nota de aluguel de um Vectra da Localiza, tendo como responsável Jacks Dias, presidente do PT, e como condutor Nedson Micheleti, o prefeito. “Isso vai bater na testa do (José) Janene”, exclamou o delegado, destacando o nome do responsável pelo pagamento: a Fóssil, empresa que faz a coleta de lixo em Londrina e que, segundo depoimento do ex-diretor financeiro da Comurb Eduardo Alonso à Justiça, tem como sócio oculto o líder do PP, José Janene, um dos líderes do mensalão.
Gtech – A partir daí, lembra
a ex-assessora, uma nova
empresa surgiu no papelório: “Começaram a aparecer notas pagas pela Gtech, empresa investigada pela CPI do Bingo envolvida em contratos suspeitos com a Caixa Econômica Federal. Contamos 12, duas na Localiza e dez na Brascar, pagando aluguel de carros Gol e Citroën”. A investigação continuou e foi descoberto um pacote com cinco notas da Avis Rent-a-Car, locando cinco Celtas para petistas locais, segundo Soraya: Oscar Bordin (vice-presidente da Sercomtel, empresa local de telefonia), Valter Orsi (ex-presidente da Associação Comercial), Antônio Ursi (assessor especial do prefeito), Claudião (segurança do vice-prefeito) e Rafael Silva (assessor de mobilização do prefeito e ex-presidente da União Londrinense de Estudantes Secundaristas). Todas as notas eram pagas por uma empresa de turismo de São Paulo, a Yaktur, que nem mesmo Soraya conhecia. Até que um acidente banal com Rafael, que recebia um mensalinho de R$ 400, revelou sua existência.
Em 10 de novembro de 2004, a Avis ligou para Soraya, no PT, cobrando R$ 200 do seguro pela batida leve num pára-lamas do Celta dirigido por Rafael. “Eu não sabia dos carros, não eram pagos por mim.” Soraya, então, ligou para a Avis de Curitiba e, lá, informaram que o locador era a Yaktur. Na Yaktur, deram um número de telefone em Brasília para Soraya tratar do problema. Ela ligou e a voz do outro lado respondeu: “SMP&B, bom dia!” Exposto o caso, a moça explicou: “Meu chefe, o sr. Marcos, não está. Ele viaja muito”, esclareceu, sem citar o nome Marcos Valério. Mas pediu que Soraya ligasse para o gabinete do então deputado Paulo Bernardo, na Câmara: “Foi com ele que fizemos o negócio. A gente ficou de pagar só o mês, sem cobrir batidas.” Soraya ligou para Cleide, secretária do deputado: “Vou passar o caso para o dr. Paulo”, disse.
Na última semana, ISTOÉ localizou o líder estudantil que bateu o Celta alugado. “É, tive um pequeno acidente mesmo, nada grave. Atuava como militante do partido”, confirmou Rafael Silva, que hoje trabalha no gabinete do prefeito Nedson Micheleti. O gerente da Avis em Londrina, João Luis Ferraro, também confirmou o acidente e o aluguel dos carros e disse que o locador era mesmo a Yaktur. Em São Paulo, um dos donos da Yaktur, Michel Langoni, negou qualquer possibilidade de ter repassado o telefone da SMP&B. “Nunca trabalhamos com esta agência. Agora, se algum carro foi alugado por alguma empresa que a gente atende, isso é problema dela.”
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